A Autoridade Reguladora da Concorrência (“ARC”) aprovou, através da Resolução n.º 1/2025, de 31 de Março, o Regulamento do Regime de Clemência (“Regime de Clemência”), concretizando, deste modo, o disposto no artigo 26.º do Regulamento da Lei da Concorrência, aprovado por Decreto n.º 97/2014, de 31 de Dezembro.
Este novo diploma visa reforçar os mecanismos de identificação e inibição de práticas restritivas da concorrência, conferindo à ARC uma ferramenta essencial, mediante a qual, indivíduos, empresas ou grupos de empresas que exerçam atividade económica em Moçambique, ou que nele produzem efeito, possam beneficiar de uma eventual redução de coimas[1].
Contexto
O Regime de Clemência aplica-se aos processos de contraordenação no âmbito de práticas anticoncorrenciais, nomeadamente, aos acordos restritivos da concorrência, decisões de associações de empresas e práticas concertadas, nos termos dos artigos 17.º e 18.º da Lei da Concorrência.
Abrange tanto os infratores já visados em processos a decorrer, como também às partes que, embora potencialmente envolvidas na prática ilícita, ainda não tenham sido formalmente objeto de um processo de contraordenação.
O Regulamento do Regime de Clemência é composto por 12 artigos, que definem de modo claro e detalhado o procedimento e os requisitos para a sua aplicação.
Os pressupostos de aplicação do Regime de Clemência
A possibilidade de beneficiar do Regime de Clemência está sujeita à verificação cumulativa dos pressupostos previstos no seu artigo 3.º, nomeadamente, a cessação imediata da prática anticoncorrencial, a inexistência ou insuficiência de provas por parte da ARC, a confissão da infração por parte do requerente e a prestação de colaboração plena e contínua, durante todo o procedimento. A ARC admite que a cessação da prática possa ser protelada, caso tal seja necessário para salvaguardar a eficácia da investigação.
A redução da coima
O Regime de Clemência consagra um sistema de redução de coimas, com base na ordem cronológica da colaboração e no valor probatório dos elementos disponibilizados pelos requerentes. Assim, a primeira empresa a apresentar provas de valor adicional significativo poderá beneficiar de uma redução entre 50% e 70% da coima aplicável, a segunda entre 30% e 50% e a terceira entre 10% e 30%. De acordo com o disposto no número 2 do artigo 4.º, a ARC avaliará o valor adicional das provas com base na sua relevância e grau de detalhe.
O procedimento
O procedimento inicia-se com a apresentação de um pedido de clemência por escrito ou por declarações orais formalizadas na sede da ARC. O requerente deve identificar-se, descrever minuciosamente a infração, indicar os participantes envolvidos e apresentar os meios de prova disponíveis.
Sempre que seja apresentado um pedido de clemência contendo todos os elementos previstos no artigo 6.º do Regime de Clemência, o processo de contraordenação que estiver em curso é suspenso por um período de 30 dias, com vista à realização da avaliação preliminar do pedido.
Conclusão
A entrada em vigor deste novo regime representa um avanço institucional significativo no sistema de enforcement das regras de concorrência em Moçambique, configurando adicionalmente, um marco no quadro legislativo do Direito da Concorrência Moçambicano.
Uma antecipada vantagem deste mecanismo será permitir o acesso a informações sobre práticas ilegais, reforçando a capacidade da ARC para agir em relação a alegadas infrações.
Com esta iniciativa, a ARC alinha-se com a prática internacional e reforça a sua capacidade institucional para prevenir, investigar e sancionar práticas potencialmente lesivas da concorrência.
À luz deste novo enquadramento legal, é aconselhável que as empresas com atividade ou negócios em Moçambique revejam os seus programas internos de compliance concorrencial, implementem canais de comunicação interna eficazes e desenvolvam rotinas de monitorização contínua de situações de risco. Em situações em que existam evidências de envolvimento em práticas anticoncorrenciais, a viabilidade de apresentação de um pedido de clemência deverá ser ponderada no quadro de uma estratégia empresarial abrangente.
[1] O regime de definição e aplicação de coimas encontra-se previsto no artigo 29.º da Lei n.º 10/2013, de 11 de Abril (“Lei da Concorrência”).
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Esta newsletter foi elaborada em parceria com a equipa de Concorrência, Regulação & UE da Abreu Advogados, sociedade de advogados parceira em Portugal.